Tombamento tardio deixa de preservar patrimônio na Mooca
segunda-feira, 4 de junho de 2012A Mooca, na Zona Leste de SP, foi um dos primeiros distritos industriais da cidade. Pelo bairro ainda existem prédios das fábricas, alguns dos últimos representantes da arquitetura industrial do início do século 20. Na última década, esses galpões foram disputados pelas construtoras, interessadas nos terrenos, os últimos na cidade com tamanho suficiente para receber grandes projetos de condomínios.
Esse foi o caso do conjunto de prédios industriais entre os números 680 e 828 da Rua Borges de Figueiredo, onde funcionaram desde 1910 depósitos e uma metalúrgica das Indústrias Matarazzo, a fábrica de bolachas Société Établissements Duchen e a Companhia Fiat Lux.
As Indústrias Matarazzo foram o maior complexo industrial da América Latina, até sofrer uma crise nos anos 1970 e pedir concordata na década de 1990. Abandonado há dez anos, o complexo foi adquirido pela Incorporadora Bellatrix e abrigará um condomínio da Construtora PDG. O Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico de São Paulo) abriu processo para tombar os galpões em 2007, mas apenas em janeiro deste ano o tombamento foi aprovado.
A demora na aprovação do tombamento permitiu que os prédios, patrimônio histórico, fossem derrubados legalmente pela construtora. Restaram apenas parte de um dos galpões, muros de fecho voltados para a linha férrea que passa ao lado do terreno e uma chaminé datada de 1911.
Parte do mesmo conjunto arquitetônico, outros prédios do entorno foram tombados em reunião do Conpresp de 17 de julho de 2007, a tempo de escapar da voracidade das incorporadoras. Foram preservados os conjuntos de edifícios dos números 300 ao 510 e do 944 ao 1.358 da Rua Borges de Figueiredo. Apesar de já estar sendo considerado para ser tombado, o conjunto dos números 680 a 828 permaneceu sob estudo, segundo a ata da reunião do Conpresp.
Descaso/ “É um crime derrubarem a memória da cidade. Lembro-me de quando ali era depósito da rede de supermercados Superbom, dos Matarazzo”, disse o comerciante João José Spinola Câmara, de 58 anos, morador da Mooca há 37 anos. “Quando ficou abandonado, o lugar servia de abrigo para ladrões e mendigos, além de ratos e baratas. Diante do descaso com o prédio histórico, talvez seja melhor que façam algo novo ali”, lamentou o coordenador de produção José Carlos de Alencar, de 58 anos, que trabalha no bairro há 20 anos.
Por meio de nota, a construtora PDG afirmou obedecer as leis de tombamento em suas obras. “A empresa segue todas as diretrizes sugeridas pelo Conpresp ao incorporar um empreendimento.” Também em nota, a Prefeitura afirmou que a demolição dos prédios históricos foi legal. “Quando o processo de abertura de tombamento foi aberto já havia algumas alterações. Como isso ocorreu antes da abertura, não há irregularidade”, informou a Prefeitura.
Inauguração: 1890-1910
Tamanho: 12.500 m²
Localização: Rua Borges de Figueiredo, números 680 a 828
Função: Galpões industriais das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo, Fiat Lux e Duchen
Situação: Pertencentes ao conjunto arquitetônico industrial histórico da cidade, os galpões foram parcialmente demolidos para dar lugar a um condomínio habitacional
1890-1900
Surgem as primeiras indústrias na Mooca, que na mesma década fica caracterizada como bairro predominantemente industrial e operário.
1911
Projetada pelo renomado arquiteto Otto Nilsson, é erguida a chaminé do então complexo metalúrgico das Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo. Nas décadas seguintes o edifício mudaria de função, servindo como armazém.
1940-1960
A empresa Fiat Lux, fabricante de fósforos, e a Societé Anonyme Anciens Établissements Duchen, produtora de biscoitos, abrem indústrias no local.
1970-1990
A Fiat Lux e a Duchen mudam seus parques industriais para outros locais. Uma crise econômica atinge as indústrias Matarazzo, que abrem concordata na década de 1990.
Julho de 2007
São tombados apenas alguns dos galpões industriais da Rua Borges de Figueiredo.
Novembro de 2007
Os galpões dos números 680 a 828, que ficaram de fora do tombamento, são demolidos.
Janeiro de 2012
O que resta dos galpões demolidos é tombado pelo Conpresp.
Fonte: Diário de S. Paulo